terça-feira, 10 de abril de 2018

UMA HISTÓRIA PARA SER PENSADA!

PREFÁCIO

Encostei-me para trás na cadeira de convés e fechei os olhos,
E o meu destino apareceu-me na alma como um precipício.
A minha vida passada misturou-se com a futura,
E houve no meio um ruído do salão de fumo,
Onde, aos meus ouvidos, acabara a partida de xadrez.
Álvaro de Campos
          
     


Poderia ser uma noite igual a todas as outras, eu assistiria algum programa sem graça na televisão, esperando que o sono viesse. Mas, por algum motivo qualquer, ou quem sabe por algum muito específico, aquela noite não fora feita para ser esquecida.
      Por mais de 40 anos, eu guardara dentro de mim uma história que teimava fazer-se presente em cada momento de minha vida, levando-me a me perguntar se haveria uma razão concreta para estar aqui, para tudo o que tinha passado, se haveria uma rota para cada alma vivente, e qual seria minha real missão nesse plano.
    Eu, Célia de Paula, sempre fora vista como uma mulher amável, uma dessas raras almas que inspiram confiança e que as pessoas em geral sentem-se a vontade para fazer confidências ou simplesmente falar sobre a vida.
      No entanto, apesar de possuidora de vários amigos e conhecidos, eram poucos aqueles que sabiam o que realmente se passava em meu coração, e menor ainda era o número daqueles que conseguiam entender o significado e as consequências disto que eu guardara com tanta sacralidade dentro de mim.
       Muitas perguntas teimavam em não cessar de minha mente e de meu coração: “Senhor Deus, O que pode ser isso? Por quê? Para quê? Quais são Seus planos para o meu futuro? O que deseja dessa pobre criatura? Será que em um dos dias vindouros algo notável irá acontecer de fato em minha vida?”.
A angústia e o vazio propuseram-me prosseguir em uma caminhada sem fim. A persistência na jornada nos livros me fizera companhia em todas as etapas de minha vida. Com isso, a cada história, irrompia-se uma perspectiva maior de esperança de poder encontrar o objeto desejado; a cada obstáculo deparado, surgia também uma nova descoberta para meus desejos e ansiedades pelas verdades nunca ditas antes.
Sentada no sofá da sala, embalada ao agradável som da chuva caindo lá fora, eu ouvia pacientemente todos os questionamentos sobre a vida feitos por minha filha Vanessa.
          Nos raros momentos em que conseguia controlar suas teorias e dúvidas sobre o que a cercava, Vanessa era uma pessoa calma, mas naquela noite eu identifiquei algo diferente nela, e foi esse algo, até hoje não muito bem esclarecido, que me inspirou a contar uma história que, além de ser parte da vida de Vanessa, também instigava mais dúvidas ou quem sabe certezas a respeito de um dos grandes mistérios da vida: “seríamos apenas peças de xadrez usadas em função de um objetivo maior, ou teríamos total capacidade de interferir no rumo de nossas vidas?”.
Eis que a partir dessa conversa com Vanessa, minha história começa.

...


– Ah! Vanessa, você não imagina o quanto busquei loucamente por respostas sobre a Verdade escondida...
– Mas que Verdade é essa? – indagou-me Vanessa apreensiva.
Como eu poderia explicar algo tão complexo à minha filha? Decidi então que o melhor seria começar contando um pouco sobre minha vida.
– Vanessa, minha filha – disse eu um pouco hesitante. – O que vou lhe contar agora faz parte de uma história de muito amor e também de desejos sobrenaturais...
Vanessa recostou-se confortavelmente no sofá e demonstrou estar pronta para ouvir. Então comecei:
– Em minha história está envolvido um ser espiritual desconhecido, mas que eu decidi intitulá-lo de “O Sem Rosto” e também uma humana apaixonada pelos mistérios da vida e da morte, vivendo anos e anos entre dois mundos diferentes, o terreno e o espiritual, ora em um, ora em outro, lutando incansavelmente pela descoberta da Verdade, de querer saber quem ela é de verdade. Hoje entendo que todas estas dúvidas tem ligação com acontecimentos ocorridos desde o meu nascimento até os dias de hoje e por isso acho importante te contar a minha história.
– Estou pronta para ouvi-la, pode começar...
– Acredito que você pouco saiba sobre isso Vanessa, mas eu nasci em uma família muito humilde e simples, meus pais moravam em uma cidadezinha quase invisível no mapa, porém com o passar dos anos essa pequena cidade cresceu e as pessoas mudaram consideravelmente seus hábitos e estilo de vida para melhor, hoje elas têm uma vida mais saudável, mais digna e muito mais confortável.
– Mas mãe, como era a vida nessa cidadezinha no passado? – questionou-me Vanessa.
– Ah minha querida filha Vanessa, naquele tempo tudo era diferente e mais difícil, na maioria das casas não havia televisão e na casa daqueles que podiam comprar, a televisão possuía imagem em branco e preto, por isso grande parte das pessoas utilizava o rádio portátil para ouvir as notícias, jogos e músicas. O fogão era a lenha, lembro-me nitidamente da deliciosa comida que minha mãe preparava neste fogão. Apesar de toda dificuldade as pessoas eram felizes, no final da tarde as famílias se encontravam para conversar nas portas de suas casas, as crianças podiam brincar sem medo nas calçadas até tarde da noite e os jovens aos finais de semana iam até uma pequena praça na cidade para tomar sorvete ou alguma bebida, e como se costumava dizer, paquerar as garotas. 
– De vez em quando – continuei – aparecia na cidade algum circo para divertir um pouco a pequena população, era uma verdadeira festa. Ah, também havia um campo de futebol para aqueles que quisessem jogar bola, ás vezes formava-se um time de meninas contra meninos, era muito divertida a época de criança, aprendíamos desde cedo a fabricar nossos próprios brinquedos, como o famoso carrinho de rolimã, por exemplo. Não era como hoje, que as crianças vão às lojas e escolhem seus brinquedos, não, antigamente não era assim.
Fiz uma breve pausa para tomar um pouco de água e continuei:
– Uma coisa muito bonita nessa cidade, minha filha, é que as pessoas tinham o costume de dividir tudo; quando matavam algum animal as crianças eram responsáveis por entregar parte dele nas casas vizinhas, entregava-se um prato com a carne e recebia-se outra coisa em troca, aquilo que a pessoa tivesse no momento ela oferecia em agradecimento, não é maravilhoso Vanessa?
– Sim mãe, gostaria que nos dias de hoje também fosse assim... – ela refletiu um pouco e pediu inquieta:
– Conte-me agora como era sua casa!

                                      ...





Quem planta flores, planta beleza e perfumes para alguns dias. Quem planta árvores, planta sombra e frutos por anos, talvez séculos. Mas quem planta ideias verdadeiras, planta para a eternidade!



Essa é minha querida árvore de Santa Bárbara.
Plantei essa formosura nos bons tempos de criança!

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